Um dia escrevo um livro…
Aparição
Tocavam doze badaladas no sino da vila, com os rostos a porejar olhámos uma para a outra, sorrimos.
Alice é uma menina doce, vivemos no nosso” mundo das maravilhas” onde o Amor prevalece.
No começo de um novo dia, levo a Alice à escola, como faço geralmente, fico no portão e aceno até deixar de ver os seus longos cabelos loiros, olha-me com um sorriso desarmante e continua.
À saída, lá vinha Alice com um semblante pesado, agarrou-me e pediu para nunca a deixar sozinha ao longo da sua vida, para a proteger sempre. Apavorada questionei o que se passara para ela se sentir assim, como se a sua cabeça estivesse embebida num carrossel sem paragens, contou-me:
“Mãe, vi um senhor igual a mim no portão da escola, aproximei-me, disse ser o meu Pai”
-Estremeci.
Continuámos, na companhia de um silêncio ensurdecedor até à vila, olhámos uma para a outra e sorri.
Apesar de não ter ficado bem, aquele olhar tem esse poder em mim, que nada mais tem, continuou: “ele disse ser o meu Pai!”
Alice nunca conhecera o seu Pai, havia morrido pouco depois do seu nascimento, expliquei-lhe: “impossível meu Amor, tu sabes” – reforçou dizendo que era igual a ela, era!
Benjamim, tornara-se uma presença assídua no carrossel que estavam as suas ideias.
Todos os dias, partilhara algo que a deslumbrava, via o quão embevecida ficara com a “presença” constante do seu progenitor.
“Mãe comemos um gelado juntos, fomos à praia, fizemos bonecos na areia, pegou-me ao colo mergulhámos, viajámos, comprou-me uma boneca linda, aquela de cabelos ruivos, sabes? foi o protagonista na festa da escola”
Acontecimentos sem fim preenchiam-na.
Última Volta, o carrossel parou.
Alice percebera que gostava de ter vivido tudo aquilo que não viveu com Benjamim.
Texto de Raquel Sofia Matos