Depressão? Há muitas!

“Depressão”, há muitas!

 

A “depressão” é um desses constructos feitos de generalizações e que deve ser desconstruído sob pena de criarmos a ideia de que estamos todos deprimidos e de que basta um banho de sol e força mental para deixarmos de o estar.

Processo de cura

O senso comum é uma ferramenta vital na nossa vida, permite-nos identificar padrões e lógicas que facilitam as relações interpessoais. Mas o senso comum aplicado a questões da saúde mental, dificilmente se adequa podendo até mesmo levar a mitos e a crenças que em nada explicam ou ajudam quem vive uma situação de maior fragilidade da sua saúde mental.

A “depressão” é um desses constructos feitos de generalizações e que deve ser desconstruído sob pena de criarmos a ideia de que estamos todos deprimidos e de que basta um banho de sol e força mental para deixarmos de o estar. Importa então descriminar as várias perturbações que partilham sintomatologia com a depressão mas que não preenchem os

 critérios clínicos (na sua totalidade) para serem classificados como tal e em que a resiliência pessoal e o tempo, desempenham um papel fundamental no processo de cura.

Transtorno ou Perturbação de Adaptação

Começamos com o mais comum, aquele a que dificilmente algum humano escapará. O Transtorno ou Perturbação de Adaptação que corresponde a fases da vida em que o sujeito passa por angustia, ansiedade, tristeza, algumas alterações comportamentais e do sono mas que são explicadas por um evento de vida adverso, como por exemplo, divórcio, luto, perda de emprego, perda de estatuto social entre outros. Esse evento de vida representa uma ameaça ao sistema vital do sujeito que passa a viver um período transitório de adaptação a uma nova realidade.

Permita-se sofrer…

Habitualmente as pessoas têm os recursos inter (rede de amigos, família, trabalho, atividades identitárias) e intrapessoais (autoestima, resiliência, autoconceito, inteligência emocional) necessários para ultrapassar esses eventos de vida sem recorrer a ajuda externa ou medicamentosa.

Processo adaptativo e vivencial a uma nova realidade que se impõe

Os processos vitais são naturais à vida e até essenciais para a maturação do sujeito. É necessário sentir a perda para que possa haver um reequilíbrio e a descoberta de uma nova realidade e do novo EU do sujeito. Estes períodos transitórios apesar de na aparência do senso comum parecerem uma depressão, na realidade não o são e na grande maioria das vezes não evolui para tal. É por isso contraproducente a toma de fármacos que anestesiem as emoções e as capacidades cognitivas do sujeito. Essa anestesia dificulta o processo adaptativo e vivencial a uma nova realidade que se impõe. Isto pode levar mais tarde ao aparecimento de sintomas psicossomáticos pois tudo o que fica latente sem ser devidamente processado acaba por ser vivido no corpo.

Mas nem sempre os recursos do sujeito (inter e intrapessoais) são suficientes para lidar com o evento adverso, neste caso podemos estar perante uma Perturbação (depressão) Reactiva. Por exemplo, a perda de emprego quando sujeito tem pouca resiliência e um suporte familiar disfuncional ou inexistente pode levar a uma maior intensidade de sintomas depressivos e a um prolongamento no tempo desses sintomas. Nestes casos a psicoterapia é recomendada para facilitar a adaptação cognitivo-emocional do sujeito, regular os hábitos de sono, a gestão de stress e a psico-educação para hábitos protectores da auto-estima e da resiliência . Este tipo de depressão tem boa adesão ao tratamento e à resolução total dos sintomas.

A partir deste ponto entramos no campo das depressões clinicas, sejam elas melancólicas ou de base psicótica. Não precisam de ter um factor/evento de vida desencadeante, é frequente não terem motivo aparente e há uma prevalência de histórico familiar também ele de depressão.  Estão incluídas neste grupo as depressões major, distimia, bipolar ente outras, e devem ser encaradas como doenças crónicas. O paciente tem melhorias significativas ao longo do tratamento mas nunca há verdadeiramente uma remissão completa dos sintomas.

Então, “depressões” há muitas… algumas curáveis outras apenas tratáveis…

Texto de Berta Santos Xavier

(Psicóloga Clínica)

 

 

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